"Eu te perdi de várias maneiras possíveis. Perdi o contato, perdi de alcance e perdi de vista. Primeiro me culpei por isso, por ser tão descuidada e te deixar solto por ai. Depois te culpei. Você que era um imbecil e idiota que conseguiu se perder e me perder, mesmo eu estando sempre tão próxima de ti. E tive raiva, meu Deus, muita raiva. Mas hoje eu lembrei de muita coisa entre a gente e não senti mais nada. Nada de raiva. Só um pouquinho de remorso por não ter aproveitado mais, quero dizer, eu me preocupei muito com o longo caminho que tínhamos pela frente e tratei de ir devagar. Agora eu me pergunto: que longo caminho? Isso nunca existiu. Era tudo uma grande ilusão. No máximo uma caminhada até a esquina para ir até a padaria comprar o café da manhã. […] Por que diabos eu fui devagar? Do que adiantou respeitar cada sinal, cada placa? Nada, absolutamente nada.
Deveria ter corrido. A mais de mil por hora. Atropelando tudo pela frente.Quem sabe não teria atropelado aquele sentimento estúpido que me colocou na sua mão por tanto tempo? Deveria ter corrido mais rápido que a velocidade do som, só pra não ouvir todas as mentiras que me disse. […] Quem sabe assim não teria sofrido tanto por tanto tempo. Não devia ter esperado sinal verde nenhum, devia ter avançado mesmo e você que se preocupasse em acompanhar meu ritmo. Ai sim, queria ver se ia conseguir.
Mas tem um restinho de mim que ainda sonha em parar ao teu lado em um sinal vermelho da vida, e que você decida abaixar o vidro e vir falar comigo, só pra dizer que quer dar uma desacelerada na rotina e adoraria fazer isso comigo. Aí, meu bem, eu ia ser mau, ia acelerar mesmo. Dane-se o sinal vermelho e você. Descobri que você é devagar demais pra mim. E eu cansei de pisar no freio pra te acompanhar. Minha velocidade está muito além da sua e eu só queria te avisar que em estrada livre, quem anda a oitenta quilômetros por hora fica pra trás, estou a mais de duzentos e agora não reduzo por mais ninguém. Nem por você."
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